No Pó e na Bruma

FERNANDO MARTINS

FERNANDO MARTINS

O sentimento da perda e da respectiva culpa não o abandonou durante todo o trajecto até casa. Como poderia passar uma boa noite sem saber do paradeiro de Irene? Como iria passar as próximas quarenta e oito horas? E, quem sabe, os muitos outros dias que se seguiriam a esses dois?

Preferia nem pensar. Tudo aquilo lhe tirava o sono. O Memo ladrou na varanda, quando Alberto R. entrou em casa e acendeu a luz. O pobre não ia à rua desde essa manhã. Embora já fosse tarde, pôs-lhe a trela e lá saíram.

O Memo dava saltos de alegria. E era como se a alegria do animal o contagiasse. Era bom reencontrar um amigo, depois de um dia de separação. Vir à rua, dar uns passos juntos, olhar o céu tão repleto de estrelas, respirar o ar tépido e perfumado da noite.

Quando voltaram para casa, o cansaço abateu-se realmente sobre Alberto R. Por mais que tentasse, não conseguia lembrar-se do que lhe tinha enchido o dia, mas sentia que tinha sido um dia cheio. Apenas uma imagem lhe acudia sincopadamente ao espírito, espécie de alarme sem som que teimava em inquietá-lo, mas sem êxito – a imagem de um cargueiro no horizonte. Foi com esta imagem que se deitou e adormeceu.

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