A ambiguidade identitária cabo-verdiana, que nunca os responsáveis pelos destinos deste país souberam, puderam ou quiseram tentar contrariar, com origens bem conhecidas e enraizadas no passado, revelou-se, após a independência, um dos muitos obstáculos ao nosso desenvolvimento e afirmação como povo.
Com a independência nacional, em vez de continuarmos a trilhar os caminhos ascendentes do "renascimento cultural" que sempre antecede, inspira, impulsiona e acompanha todos os verdadeiros movimentos de libertação, optámos, com uma ligeireza confrangedora, por correr atrás de fantasias, de "cantos de sereias" e de ilusórias facilidades que, no fundo, mais não têm feito que dar destas ilhas uma imagem que muitos já consideram "pouco digna do passado em que se sonhou o futuro".
E foram eles, os políticos, que, umas vezes com laivos de autoritarismo, outras vezes sob a bandeira de uma democracia que nasceu naturalmente pequenina, algo tosca, e que muito lentamente vem tentando amadurecer, se constituíram em timoneiros.
Desempenharam bem o seu papel? Souberam ou puderam escolher as melhores rotas, os melhores caminhos? Souberam ou puderam escolher as melhores parcerias, os melhores parceiros? Ter-se-iam esforçado o suficiente por conhecer, com a necessária profundidade, toda a realidade que se propunham transformar? Souberam conceber, projectar e estimular a edificação das bases históricas e socioculturais onde o povo das ilhas, em liberdade, pudesse encontrar, moldar e enraizar as razões que sustentassem o orgulho, a dignidade nacional, o patriotismo, sentimentos sem os quais nenhum povo, nenhuma nação, nenhum estado, poderá aspirar a um futuro digno?